Pedalinas com a mão na graxa

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No próximo sábado (12), as Pedalinas promovem o primeiro encontro de mecânica de bicicletas de e para mulheres. Tópicos básicos de sobrevivência nas ruas para não gastar $$ e se virar nos perrengues clássicos d@s ciclistas urban@s.

A oficina acontece durante a tarde no espaço Ay Carmela, mas o grupo se encontra às 14h na Praça d@ Ciclista (av. Paulista, entre Bela Cintra e Consolação). Leve a sua bicicleta, as ferramentas e os conhecimentos que tiver à disposição.

E não deixe de visitar o blog das Pedalinas para maiores informações.

A revolta de Gaia na várzea do Tietê

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arte: cc Paulo Ito

Em 1926, o engenheiro Saturnino de Brito apresentou à administração paulistana um plano de ocupação das margens do rio Tietê. Conhecedor da dinâmica dos rios e estudioso do Tietê, Brito recomendou a construção de um grande parque linear e a preservação de áreas permeáveis ao longo da várzea, que já começava a ser ocupada pelos habitantes da capital.

O plano de Saturnino de Brito baseava-se em um princípio bastante simples: rios tem períodos sazonais de cheias. Desde a antiguidade, rios como o Nilo, Tigre e Eufrates foram aproveitados pelos povos ribeirinhos para a agricultura e irrigação. Nenhum faraó foi estúpido o suficiente para construir uma pirâmide à beira do Nilo, pois sabia que ela seria destruída pela água no período de cheia.

O desenvolvimento da ciência consolidou ao longo dos séculos XIX e XX a falsa ideia de domínio absoluto da Natureza. Bastavam alguns cálculos, algumas estimativas e o emprego de tecnologia para que as forças naturais fossem subjugadas pela espécie que tinha como principal diferença das outras o polegar opositor, o telencéfalo altamente desenvolvido e um potencial destrutivo nunca visto entre as outras espécies.

A administração da cidade jamais colocou em prática o plano de Brito, substituído pelo Plano de Avenidas do também engenheiro Prestes Maia, que previa a construção de vias expressas e pontes sobre o rio. A época de Prestes Maia marcava a chegada agressiva da indústria automobilística no Brasil, que teve como consequências nas décadas seguintes o desaparecimento dos bondes, o espalhamento da cidade e a readequação do tecido urbano à dinâmica do fluxo motorizado.

Ao longo do século XX, a área de vazão das cheias nas margens do rio Tietê foi urbanizada, impermeabilizada e transformada em largas faixas de rolamento para veículos motorizados. A área que cumpria uma função de equilíbrio na mais importante bacia hídrica da região sudeste foi reduzida ao utilitarismo motorizado.

A cada tentativa humana de subjugar a Natureza, forças muito maiores do que a vã tecnologia davam o troco. Muitas vezes a resposta de Gaia não é imediata, já que o tempo histórico da readaptação da Natureza não é tão veloz quanto o das agressões humanas. Mas a única certeza é que a resposta da Natureza sempre virá. Seu mecanismo de funcionamento é complexo, possui uma série de inter-relações bastante sutis e, principalmente uma capacidade de ação muito maior do que pode imaginar o estúpido ser humano.

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arte: R. Crumb

Tecnocratas almofadinhas e políticos com sede de poder geralmente não acreditam nestas “bobagens”. Tentam a todo custo racionalizar e adaptar ao seu interesse o que, no máximo, poderia ser compreendido e respeitado. Encontram dezenas de respostas, mostram milhares de números e apresentam dezenas de “compensações” para a destruição que pretendem causar. Tudo “bate” no raciocínio tecnocrata, todos os números “fecham” e com a ajuda de muita propaganda eles convencem as massas por A+B que conseguirão dominar a força da Natureza e trazer apenas benefícios depois de cada ação destrutiva.

A tecnociência agora veste-se de verde: depois da descoberta de que a maior vítima de todas as ações antrópicas sobre o planeta é o próprio Homem e sua principal criação, o Mercado, os tecnocratas incorporaram o discurso ecológico à racionalidade que só lhes serve para a perpetuação da insustentabilidade e para a manutenção de seu domínio sobre outros seres.

– “Destruiremos este pedaço aqui, mas vamos plantar milhares de árvores logo ali e tudo vai ficar bem”.

– “Vamos impermeabilizar estes 19 hectares, mas criaremos calçadas permeáveis e plantaremos milhares de árvores em toda a cidade e tudo vai ficar bem”

– “Desperdiçaremos recursos naturais em uma sociedade de ultra-consumo, mas já desenvolvemos técnicas de reciclagem para nos salvar e tudo vai ficar bem”

– “Destruiremos a atmosfera, aumentaremos o nível dos oceanos, mas criaremos um mercado de troca de poluição por dinheiro e tudo vai ficar bem”

A cheia de ontem no rio Tietê não foi a primeira nem será a última de sua história. Mas os tecnocratas almofadinhas e os políticos com sede de poder não se importam com isso. Pagam os melhores técnicos e porta-vozes para que estes demonstrem que uma “compensação ambiental” irá dominar a força da Natureza e impedir que a reação de Gaia atinja a população.

Faraós do antigo Egito, crianças de cinco anos, pescadores que vivem da própria pesca e qualquer ser humano que não tenha as mesmas ambições dos tecnocratas almofadinhas ou dos políticos com sede de poder conseguem entender que a impermebilização de 19 hectares na várzea do rio Tietê é um anacronismo sem tamanho, uma insanidade que nenhuma racionalidade científica poderá contornar, que nenhuma compensação ambiental poderá “compensar”.

A chuva de ontem realmente não foi comum. Também não foi inédita. O fato é que este tipo de “anormalidade” tem acontecido com cada vez mais frequência no planeta, exatamente como reação da Natureza a todas as ações “racionais” do homem para tentar dominá-la. Mas sempre teremos um tecnocrata de plantão para dizer que isso não tem nada a ver com a ação destrutiva do Homem e para explicar que “vai ficar tudo bem”.

Qualquer governo minimamente prudente e/ou realmente preocupado com o futuro de seus governados deveria buscar desde já alternativas para proteger a humanidade e a natureza destas “anormalidades cada vez mais frequentes”. É irresposnável e criminoso o governo que insiste no caminho oposto. É cínico e mentiroso o governo que reduz a complexidade de Gaia à racionalidade mercantilista do Carbono.

A ideia de que tudo pode ser racionalizado e comercializado (como se pretende fazer com os créditos de carbono) só interessa à sustentabilidade do Mercado, só interessa aos tecnocratas almofadinhas e aos políticos com sede de poder.

A falácia de que a impermeabilização de mais alguns quilômetros de margem do Tietê será compensada por promessas de plantio de árvores, de criação de um parque distante e até pela redução da emissão de Carbono é apenas uma falácia verde dos tecnocratas de plantão e dos políticos com sede de poder. Em primeiro lugar porque tais promessas geralmente não são cumpridas integralmente. Em segundo, porque esta racionalidade não tem nada a ver com o estabelecimento de uma relação equilibrada entre o homem e o ambiente.

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arte: R. Crumb

A grande ironia da resposta de Gaia é que as chuvas de ontem que fizeram o rio Tietê transbordar é que ela veio antes mesmo da impermeabilização proposta pelas seis pistas de asfalto da “Nova” Marginal estarem prontas, talvez uma tentativa de mostrar que ainda é possível mudar o caminho escolhido. Infelizmente, tecnocratas almofadinhas e políticos com sede de poder vão afirmar que tudo isso é “bobagem”, que suas técnicas, números e promessas vão “deixar tudo bem”.

PS: Algumas entidades da capital entraram com uma ação na Justiça pedindo a interrupção das obras da “Nova” Marginal. Uma moção de repúdio à obra e a favor das alternativas está disponível na internet e pode ser lida e assinada neste link.

Clipping de notícias sobre a “Nova” Marginal, incluindo a cheia de ontem
Textos, artigos e vídeos publicados anteriormente sobre a Nova Marginal
vídeo vozes do clima sobre mudanças climáticas, enchentes e carros nas cidades

In dependência

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Independência, petróleo e amazônia

Domingo no parque

Amanhã acontece de novo a ciclofaixa de lazer ligando três parques da capital. Ainda não conheci o projeto ao vivo e também não será neste fim de semana, mas o video de Tomaz Cavalieri e todas as impressões e notícias que vi durante a semana mostram que a experiência é bem legal.

Não haveria como ser de outra forma. Exceto por uma minoria barulhenta (e ainda dominante), a população de São Paulo está absolutamente disposta e ansiosa para construir outros paradigmas de convivência, mobilidade e ocupação do espaço público.

O “sucesso” da iniciativa demonstra a urgência da criação de espaços públicos destinados às pessoas, da valorização da locomoção para além do automóvel. O estado de segregação, agressividade e solidão provocados pela prioridade absoluta ao automóvel chegou a níveis insuportáveis e a população está disposta a revertê-lo.

A ciclofaixa de lazer é (mais um) símbolo deste horizonte reprimido, mais uma “falha na matrix” motorizada que começa a se tornar real no século pós-automóvel.

Dito isto, não nos furtamos de lembrar alguns pontos:

– De acordo com os Planos Regionais Estratégicos aprovados em 2004, a cidade de São Paulo deveria ter 367 km de ciclovias construídas até 2012. De acordo com a Lei, a cidade também deveria ter feito um Plano de Circulação e Transportes, jamais apresentado.

– Se a cidade tivesse cumprido a Lei (ainda em vigor), 275km de faixas permanentes destinadas à bicicleta deveriam ter sido entregues ainda em 2006. Com isto, teria sido possível avaliar, corrigir, melhorar e integrar a estrutura prevista em 2004.

– A turbulenta revisão do Plano Diretor que está em curso deverá oficializar o “não fizemos” e legitimar a atual promessa de 100km de vias destinadas à bicicletas para 2012.

– Os mesmos 100km já haviam sido prometidos para 2006 e depois para 2009.

– Qualquer um dos números acima continuaria a ser insignificante em uma cidade com 18 mil km de vias pavimentadas, tornando fundamental o estabelecimento definitivo de garantias de segurança e tranquilidade para que os ciclistas possam compartilhar a rua com os demais veículos (como prevê o Código de Trânsito Brasileiro). Em última instância, todo bordo de rua que não possua estrutura cicloviária é uma ciclofaixa, ou seja, uma faixa preferencial para bicicletas.

– A ciclofaixa de lazer marca a passagem das iniciativas cicloviárias na cidade para a Secretaria dos Esportes. Se durante os primeiros anos da gestão Serra-Kassab os rostos midiáticos que falavam sobre bicicleta eram ligados à Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, depois do início das obras de construção de 6 novas pistas na Marginal Tietê, é o secretário Walter Feldman o novo “homem das bicicletas” na prefeitura e nos jornais. A Secretaria dos Transportes, que na metade deste ano assumiu a coordenação do grupo pró-ciclista (antes a cargo da SVMA), continua sendo ator coadjuvante.

Bom domingo e bom lazer a tod@s.

Pedal Cultural 2009 – Nos trilhos do trem das 11

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Enquanto eles desfilam em tanques, nós passeamos de bicicleta…

No dia 7 de setembro, um tributo aos versos e à vida de Adoniran Barbosa. O Pedal Cultural 2009 vai percorrer de bicicleta o caminho do imortal “Trem das Onze”, com pausas lúdico-culturais em cada uma das antigas estações.

“Agora não preciso mais de condução
Moro e trabalho aqui mesmo no meu bairro
Jaçanã
Mas sofri uma grande decepção quando disseram
Vá lá embaixo ver, tão derrubando a nossa estação
Fui lá vê se era verdade
E era”…

Pincharam a Estação no Chão – Adoniran Barbosa

Local:
Praça do Ciclista (Av. Paulista, entre as ruas da Consolação e Bela Cintra)

Iniciantes com receio do percurso poderão se juntar ao “Trem das Onze” nas estações do Metrô que nossa composição cruzará: Portuguesa-Tietê, Carandiru, Parada Inglesa ou mesmo Tucuruvi.

Horário:
Concentração as 08h32 minutos, sem adendos!
Partida as 09hs27 minutos!

O trajeto:
Vamos passar por pontos importantes citados por Adoniran Barbosa, próximos a zona norte de São Paulo!

Mais informações:
Pedal Cultural 2009 – Bicicletada
Pedal Cultural 2009 – xupakavraz

Pedal Cultural 2008

Fontes :
Estações Ferroviárias
As Ferrovias Urbanas da Cidade de São Paulo
Tramway da Cantareira – o trem das 11

Bicicletada toda sexta de setembro

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Seguindo a tradição e reciclando o convite, a Bicicletada paulistana durante o Mês Sem Carro acontece todas as sextas feiras.

Como sempre, concentração às 18h, na Praça do Ciclista (av. Paulista, entre Haddock Lobo e Bela Cintra), pedal sem carro às 20h.

2 pra 1

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imagem: reprodução / Diário da Corte

O castelo acima é apresentado como “o maior apartamento do Brasil”. Fica (obviamente) em São Paulo, no bairro do Morumbi.

Tem o dobro de vagas para automóveis que o número de dormitórios para as pessoas.

Pura inspiração em Alexandre de Moraes, o multi-secretário que anda com dois carros pela cidade, ou apenas algo cada vez mais comum entre a classe amedrontada, que carrega para todos os lados a sua polícia privada?

Olho da Rua

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foto: Alderon Costa

A partir desta quarta-feira (02), a Galeria Olido recebe a exposição Olho da Rua. Como diz o texto de apresentação, a mostra “procura adentrar o universo das pessoas que vivem em situação de rua, suas dificuldades, estratégias de sobrevivência, problemas decorrentes, expectativas de vida, possibilidades de luta e transformação social. A idéia é unir o trabalho de artistas que refletem sobre o tema com o olhar de pessoas que diretamente vivenciam ou vivenciaram o universo das ruas.”

Visite o blog da exposição para conhecer os artistas participantes e a programação completa.

A inauguração acontece na quarta-feira, às 19h, no primeiro andar da galeria (Av. São João, 473, Centro) e fica em cartaz até o dia 4 de outubro (de segunda a à 6ª feira, das 12h às 20h30 e Sábado, domingo e feriados das 13h às 20h30).

TV no ônibus, a comercialização das mentes e a lei Cidade Limpa

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arte: cc adbusters

Conforme a previsão feita por este blog em 18 de Agosto, não levou muito tempo até que a legislação municipal que proibia a exibição de programação televisiva ao vivo dentro dos ônibus fosse alterada.

Apenas 11 dias depois de proibir os testes da Rede Globo em alguns coletivos da cidade, o Secretário Municipal de Transportes publicou uma portaria no último sábado (29) autorizando a iniciativa. Globo, Record e Bandeirantes devem disputar os olhares confinados de milhões de passageiros de ônibus da capital.

A iniciativa se insere em um conjunto de medidas que visam explorar ao máximo o potencial comercial do transporte sobre pneus, sem que isso signifique a melhora do serviço. Há poucos dias foi divulgado que a Prefeitura pretende acoplar ao Bilhete Único um cartão de crédito, transformando milhões de passageiros em potenciais endividados.

A portaria da SMT justifica-se em dois princípios: a Lei Cidade Limpa e o aumento de receita (só não fica claro quem será beneficiado por este aumento, já que em nenhum momento fala-se da destinação destes recursos ou obriga-se a Prefeitura a reinvestir o montante no sistema de ônibus).

Como é sabido até pelo mármore do Palácio Anhangabaú, a Lei Cidade Limpa não tem nada a ver com a extinção da publicidade do ambiente urbano. Trata-se, na verdade, de potencializar a exploração comercial de alguns espaços da cidade: retirar o excesso para tornar mais efetiva (e rentável) a veiculação de publicidade.

Em um primeiro momento, a proibição de anúncios trouxe alívio aos olhos e mentes superexpostos aos impulsos da propaganda. A segunda fase da Lei, em curso neste momento, pretende identificar e vender pontos-chave para que a exploração publicitária aconteça de forma “ordenada”.

Os critérios de “ordenamento” são vagos. Fala-se que apenas o loteamento da cidade em regiões para grandes empresas de marketing poderá fornecer recursos para equipar a cidade com mobiliário urbano como pontos de ônibus, bancos e lixeiras.

No entanto, em regiões nobres da cidade, o poder público vem investindo em mobiliário urbano pronto para ser explorado comercialmente (vide a quantidade absurda de lixeiras de concreto instaladas na Av. Paulista).

A política faz parte da “sedução” à iniciativa privada: oferecer pontos importantes e prontos para o uso deverá facilitar o negócio com as gigantes da propaganda, que provavelmente só será concretizado no biênio que antecede a próxima eleição municipal, quando a propaganda deve voltar definitivamente e em esquema de monopólio (ou, no máximo, oligopólio) “ordenado”.

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Qualquer estagiário de comunicação ou publicidade sabe que o excesso de informação e de estímulos visuais do mundo contemporâneo causa dispersão e dificulta a transmissão das mensagens. As redes de televisão descobriram há muito tempo que o controle remoto é um dos principais inimigos de seus departamentos de marketing.

Exibir a programação em um ambiente confinado é uma oportunidade incrível para as empresas de comunicação conseguirem manter sua presença na mente da população em um mundo fragmentado e disperso. E manter a presença na mente da população significa, essencialmente, preservar o poder político destas empresas no país.

Não se trata de teoria da conspiração ou radicalismo: é fato que a mídia brasileira, em especial a televisão, desempenha um papel que vai muito além da “mediação” de informações. Também é fato que o poder público quase sempre se curva aos interesses destas empresas.

Não seria diferente com a exibição de conteúdo ao vivo das grandes redes comerciais dentro dos ônibus. Não foi preciso nenhum movimento, protesto, ação judicial ou contestação pública das emissoras para que a Prefeitura revogasse uma determinação anterior para atender ao interesse das empresas. A SMT lavou as mãos. O secretário Alexandre de Moraes não se pronunciou sobre o assunto. Assinou a portaria e transferiu a responsabilidade à SPTrans, órgão que é o “patinho feio” do setor de transporte da capital.

A exposição compulsória de passageiros de ônibus à programação televisiva das redes comerciais é uma afronta. Não apenas porque o transporte coletivo da capital é caro e ainda muito aquém dos padrões mínimos de qualidade, mas também (e principalmente) por ser extremamente invasiva. Ninguém pode ser obrigado a ser exposto algumas horas do dia a telas com mensgens compulsórias, ainda mais dentro de um veículo que deveria servir ao transporte, um direito do cidadão.

Sorria, você será manipulado. E vai pagar R$2,30 por isso.
TVs em ônibus ficam silenciosas – Nós
Novo Bilhete Único de crédito para o endividamento em massa

Ciclofaixa à paulistana

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No próximo domingo a Cidade de São Paulo inaugura suas primeiras ciclofaixas oficiais. Serão 5km de faixas para bicicletas ligando três parques da capital (Ibirapuera, do Povo e das Bicicletas). A ligação entre parques é um projeto experimental da Secretaria dos Esportes, previsto na lei 10.908, de 1990 (regulamentada pelo decreto 34.855, de 1995).

Nesta primeira etapa de testes, que deve durar 2 meses, a Ciclofaixa de Lazer funcionará apenas aos domingos, das 7h às 12h. A inauguração acontece neste domingo (30), às 10h30, no Parque das Bicicletas.

O projeto é bem-vindo. Deverá estimular o uso das bicicletas nas ruas, ainda que em situação “protegida”  e bastante distante da realidade cotidiana dos ciclistas (além das faixas pintadas no chão, cones de proteção, agentes da CET e redução de velocidade motorizada para 40km/h fiscalizada por radares devem garantir a segurança dos usuários).

Fazer com que o motorista se “acostume” a compartilhar a rua é, sem dúvida, uma das tarefas mais importantes para qualquer cidade que deseja superar a sociedade do automóvel. Estimular o uso das bicicletas aos domingos também pode servir para multiplicar os potenciais usuários cotidianos de bicicletas.

A inspiração para o projeto paulistano, como conta o Secretário Walter Feldman em seu blog, é o projeto “Ciclovía”, que acontece aos domingos em Bogotá (Colômbia), cidade que dedicou especial atenção à mobilidade e ao resgate do espaço público durante as gestões dos prefeitos Antanas Mockus e Enrique Peñalosa.

Em 2008, a ideia de fazer a ligação entre parques foi exportada para os EUA pelo irmão de Enrique, Gil Peñalosa. Na terra do Tio Sam, foi apelidada de “Sunday Parkways” (caminhos entre parques aos domingos) e virou a coqueluche do verão em cidades como Portland, Nova Iorque e São Francisco.

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ruas totalmente fechadas durante o Sunday Parkways em Portland, junho de 2008

Duas diferenças fundamentais marcam a “Ciclovía” de Bogotá e os “Sundays Parkways” estadunidenses do projeto da Ciclofaixa de Lazer paulistana.

A primeira é que na cidade colombiana e nas cidades dos EUA, o fechamento das ruas para os veículos motorizados é total. Em São Paulo, apenas uma faixa das vias será destinada às bicicletas, que compartilharão espaço com veículos motorizados. São Paulo já teve algo parecido com o projeto colombiano há alguns anos, quando vias como Paulista e Sumaré eram totalmente fechadas ao fluxo motorizado para dar lugar ao esporte, lazer e convivência entre as pessoas.

No projeto paulistano, a faixa escolhida para o tráfego de bicicletas nas manhãs de domingo foi a da esquerda. Segundo técnicos envolvidos no projeto, a escolha das faixas à direita (de tráfego mais lento) traria complicações já que a maior parte das conversões dos veículos motorizados são feitas à direita (e não à esquerda). Perdeu-se aí uma grande oportunidade pedagógica de reforçar a preferência do ciclista na via: carros que viram à direita DEVEM dar preferência aos ciclistas que seguem reto. Essa é a prática em todas as cidades que consideram a bicicleta parte do trânsito.

Os “Sunday Parkways” de Portland também tinham alguns poucos cruzamentos com  veículos motorizados. Nestes locais, agentes de trânsito faziam as vezes de semáforos para organizar o fluxo, dando preferência às bicicletas quando estas estavam em número razoável e liberando a passagem dos motorizados quando eram poucos os ciclistas atravessando a via.

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ciclofaixa paulistana / foto: vá de bike

Mas a opção foi por uma via compartilhada com os motores com a finalidade de proporcionar lazer seguro à todas as idades sem “atrapalhar o trânsito”. A lógica de agradar a gregos e troianos não é de todo ruim na cidade do automóvel: dizem que faz parte da estratégia de convencimento da opinião pública e serve para ganhar espaço para as magrelas no inconsciente coletivo.

Resta apenas um  complicador: a faixa da esquerda em avenidas é a de mais alta velocidade e jamais seria o local indicado para uma faixa permanente (ainda que o Código de Trânsito Brasileiro garanta o direito das bicicletas trafegarem nos dois bordos da pista).

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ciclofaixa (bike lane) permanente em São Francisco

A segunda e mais fundamental diferença entre o projeto paulistano e o que Gil Peñalosa exportou para os EUA  é que todas as quatro cidades citadas (Bogotá, Portland, São Francisco e Nova Iorque) já possuíam uma estrutura cicloviária minimamente desenvolvida e já tinham inserido a bicicleta em seus departamentos de transporte antes de estabelecer as rotas de lazer aos domingos.

São Paulo, talvez pelo espírito festivo que marca este país, talvez pela dificuldade de tirar do papel qualquer coisa que não seja túnel, ponte ou viaduto, começou pelo lazer antes de ter incorporado de fato a bicicleta ao planejamento urbano e com pouco mais de uma dezena de quilômetros de infra-estrutura cicloviária para o transporte na cidade.

Talvez a afetividade e a cordialidade descritas por Sérgio Buarque de Hollanda como características deste povo tragam algum alento e esperança aos mais céticos e racionais. Quem sabe o “esquindô, esquindô lelê” de domingo abra portas e janelas nos corações e mentes dos carrocratas paulistanos para, enfim, termos algo realmente concreto em termos de política pública de mobilidade urbana para além do automóvel.

Por enquanto, fica o convite: prestigie a Ciclofaixa de Lazer. Ocupar os espaços que se abrem é uma importante forma de construir outras cidades possíveis.

Ciclofaixas aos domingos – como vão funcionar (Vá de Bike)
Ciclofaixa aos domingos – mais detalhes (Vá de Bike)
Convite para a ciclofaixa de Lazer (blog Transporte Ativo)
Primeira ciclofaixa de lazer começa a funcionar no domingo (MNSP)
As ciclovias prometidas, a ciclo-faixa de fim de semana e eu (A escola, a bicicleta e a vida)
Teste da Ciclofaixa em São Paulo (vídeo – Renata Falzoni)
Para ganhar as ruas (blog Transporte Ativo)
Ciclofaixa: aprendendo com Bogotá (Walter Feldman)
Magrelas unidas jamais serão vencidas (Walter Feldman)
Ciclo Faixa entre parques de São Paulo aos domingos (A escola, a bicicleta e a vida)
Ciclofaixas aos domingos – juntando as peças (vá de bike)
Ciclofaixa de Lazer (Walter Feldman)
Reconhecimento da Ciclofaixa (Vá de Bike)
Ciclofaixa já está pintada (Vá de Bike)
Site oficial divulgação da ciclofaixa
SP ganha 1a ciclofaixa e trilha no Piqueri (OESP)
Prefeitura lança ciclofaixa que liga três parques aos domingos (Prefeitura)