O X do tesouro, um ano depois

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O Estilingão completou ontem um ano de funcionamento como polo de atração de tráfego e cenário para o telediário oficial da cidade. A Ponte Octavio Frias Filho (ex-quase-ponte Roberto Marinho, vulgo Estaiada) foi inaugurada no sábado, 10 de maio de 2008.

As bicicletas (proibidas na via) foram os primeiros veículos a cruzar o asfalto, trazendo um grupo de ciclistas que realizou um pique nique em cima da ponte, protestando contra o investimento incessante e inútil no transporte individual motorizado.

Um ano depois, a cidade parece continuar no mesmo caminho suicida: no começo do ano, a Prefeitura anunciou mais R$ 2,5 bilhões de reais em um novo pacote de obras viárias. Na semana passada, o Governo do Estado inaugurou, ao custo de R$ 400 milhões, mais duas pontes na via Anhanguera e anunciou mais R$800 milhões para construir mais uma faixa de rolamento para os motorizados na Marginal Tietê.

Todas as obras viárias citadas podem ser consideradas ilegais, já que não atendem o que está previsto na lei 10.907. Segundo o texto, toda avenida construida ou reformada em São Paulo deveria ter ciclovia. A lei é de 1990, foi regulamentada pelo decreto 34.854, de 1995, mas jamais foi cumprida.

A construção do Estilingão, além de não contemplar a passagem de pedestres e ciclistas, trouxe ainda consequências indiretas para o fluxo não-motorizado na região.

Para aliviar as consequências do aumento do número de motores trazidos pela nova ponte, a Prefeitura resolveu tranformar em faixa de alta velocidade um trecho de 4km de acostamento na Marginal Tietê. Ciclistas e pedestres perderam seu espaço de circulação segura e agora são obrigados a violar a lei (que não permite bicicletas em vias como a Marginal) ou fazer um longo desvio por dentro do Morumbi.

A medida gerou protestos e um grupo de ciclistas resolveu repintar o acostamento. A resposta foi instantanea: um ciclsita detido, a pintura apagada no dia seguinte e mais uma ameaça de multa. Inicou-se então um debate entre o ciclista André Pasqualini e os secretários municipais de Transportes e de Meio Ambiente.

No último final de semana, os ciclistas resolveram botar a mão na massa para construir uma alternativa imediata: começaram a roçar um “atalho” que passa por áreas vazias ao lado do trecho onde o acostamento foi removido. A rota, batizada de Cicloterra, promete ser um caminho agradável e seguro para os ciclistas vítimas do Estilingão.

O Estilingão talvez seja o monumento mais sincero e explícito da vocação paulistana pelo urbanismo financeiro, baseado no uso privado do Estado para a conquista de benesses e privilégios para grandes grupos econômicos. Sedimentada no princípio único do uso do solo como commoditie especulativa, toda a chamada “região da Berrini” foi erguida em pouco mais de 15 anos.

O “projeto urbanístico” da região teve como pilares a corrupção (a forma mais rápida de realizar empreendimentos deste porte), a destruição do senso de comunidade (ao transformar bairros inteiros em espaços “funcionais”), e a adequação do território para atender apenas o fluxo e a acumulação de capital. É na região da Berrini que se encontram hoje as filiais de boa parte das transnacionais que controlam o mundo. A destacar os bancos e instituições financeiras, a indústria bioquímica e as coporações de tecnologia e mídia (além do consulado dos EUA).

A trajetória da região é plural e democrática, como as contribuições eleitorais do setor imobiliário aos políticos em campanha: com exceção feita a administração de Luiza Erundina (1989-1993), todas as gestões municipais deram sequência ao projeto viário iniciado pela administração de Jânio Quadros (1986-1989), que começou a perfurar a região do Itaim em direção ao Morumbi (ná época já consolidado como bunker migratório para ricos e nem tanto).

Do projeto de Jânio nasceram quatro túneis com nomes tão simbólicos quanto “ponte Octavio Frias”. São eles:  túnel Jânio Quadros (batizado por Paulo Maluf), túnel Tribunal de Justiça (homenagem ao prédio dos escândalos do juiz Lalau, que fica na região e foi construído junto com os túneis), Sebastião Camargo (fundador da construtora Camargo Corrêa) e Ayrton Senna.

A segunda etapa do projeto foi a expansão da especulação imobiliária para além da Juscelino Kubitscheck. A “abertura da Águas Espraiadas” (e o processo especulativo e de gentrificação na região) foi executada com maestria durante as gestões de Maluf e Pitta (1993-2000),  mas foi Marta Suplicy  (2001-2004) quem deu a cereja do bolo ao renomear a avenida para “Roberto Marinho”.

O Estilingão, que só não foi chamado de Roberto Marinho porque alguém se lembrou que dois logradouros não podem ter o mesmo nome, ganhou o status de “cartão postal” mesmo antes de nascer, através de matérias efusivas da mídia corporativa e de uma centena de propagandas e reportagens que traziam a ponte como cenário. Folha de São Paulo e Globo fizeram a cobertura mais saltitante do novo “símbolo de São Paulo”. Além de dividirem os nomes dos logradouros fincados  aos pés do X do tesouro, as duas empresas de mídia são sócias em algumas empreitadas comerciais.

O novo “cartão-postal” surgiu de maneira tão natural e espontânea quanto a eleição das novas maravilhas do mundo, que aconteceu há alguns anos por iniciativa de um grupo de especuladores e empresas de mídia. As semelhanças não param por aí: tanto a eleição das maravilhas quanto o Estilingão foram bancados com dinheiro da população. A diferença é que o dinheiro que escolheu as maravilhas foi dado de maneira voluntária (ok, desconsidere o 171), enquanto o Estilingão foi construído com os impostos cobrados de tod@s os habitantes.

Entre os 2,5 bilhões anunciados por Kassab em seu “pacote de túneis” está contemplado o prolongamento da Avenida Águas Espraiadas até a Rodovia dos Imigrantes, consolidando mais um anel milionário de congestionamento e especulação no meio da cidade.

Fica desde já a sugestão de nome para a nova obra viária “que vai acabar com os congestionamentos na região”: túnel Paulo Maluf. Se a natureza (da vida e das obras públicas) seguir seu rumo, são grandes as chances do ex-prefeito já não estar entre nós quando a ligação Espraiadas-Imigrantes for inaugurada. Imagina que beleza: sair do Morumbi em direção ao litoral  e passar na sequência por Octavio Frias, Roberto Marinho e Paulo Maluf?

Um monumento à sociedade do automóvel
Ciclistas inauguram cartão postal com piquenique em São Paulo
Cartões postais
Quem vai pagar pelo trânsito da Ponte Estaiada – vá de bike
Pacote de túneis de Kassab – ecologia urbana
Mais e mais para a minoria – ampliação da Marginal Tietê – panóptico
Comprovado: a fluidez motorizada é mais importante que a segurança da população – ciclobr
Carta aberta aos Secretários de Transportes e Meio Ambiente – ciclobr
Cicloterra – fotos

Círculos

Guarapuava (PR), setembro de 2008

Curitiba, novembro de 2007

Los Angeles (CA – EUA), julho de 2008

Sacramento (CA – EUA), setembro de 2008

São Paulo, novembro de 2008

Mães

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Plaza de Mayo, Buenos Aires, Argentina

Só para elas

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Acontece neste domingo (10) um passeio de bicicleta só para meninas em São Paulo. A iniciativa, ainda sem nome, nasceu entre as participantes da bicicletada.

A saída é as 10h da manhã, da Praça d@s Ciclistas (av. Paulista, entre Bela Cintra e Consolação).

Mais informações sobre o pedal das meninas
Saia na Noite: outro grupo feminino de passeio

Um sonho

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arte: consumehastamorir / alguns direitos reservados

Porque nós te amamos (reloaded)

dica do igor abreu e também no bicicletada curitiba

(04.abr) Campanha “Brug cykelhjelm, fordi vi elsker dig” (use um capacete, porque nós te amamos), da administração da cidade de Aalborg, na Dinamarca.

(05.abr) PS: postei esse vídeo antes de ler a discussão no bicicletada curitiba ou os links indicados nos comentários. Achei interessante o vídeo exatamente porque os policiais deixam passar alguns ciclistas sem capacete no começo do vídeo (as meninas) e só abordam  alguns passantes  (o cara de fone no ouvido e outros que estariam em condições mais “arriscadas”).

Os contextos de segurança, uso de capacete e uso de bicicletas são diferentes em todo o mundo. O que pode ser um “desestímulo ao uso de bicicletas” ou uma medida paternalista e repressiva na Dinamarca, pode significar em outras partes uma demonstração de atenção do poder público para a locomoção humana. Além disso, a imagem dos policias praticando atos “bons” é bastante inspiradora.

(06.abr) PS 2: Ok, segue abaixo outra inspiração poética para a polêmica, encontrada no português ma fyn bach.

Assim como ciclovias, consumo de álcool, subidas, qualidade das bicicletas, o clima, hábitos alimentares e outros ítens, o uso de capacetes não é algo para ser “contra ou a favor” por princípio.

O uso de bicicletas é tão variável quanto a espécie humana. Bicicletas, ainda que invisíveis aos olhos urbanos midiáticos, circulam pelo planeta Terra bem antes dos carros, em todos os países, usadas por todas as classes sociais, em todos os tipos de terreno, por diversos tipos de pessoas.

A tradição de associação dualista entre bicicleta e esporte, importada dos EUA, fez com que o uso dos capacetes passasse a ser visto como algo correto. Na Europa, exceto nos “Tours e Giros”, os ciclistas jamais usaram capacete. Da mesma forma os chineses, africanos, brasileiros…

Em número de pessoas e de viagens, o uso de capacetes continua sendo insignificante na espécie humana e isso não fez da bicicleta um objeto genocida – como acontece, por sinal, com o super-equipado automóvel.

Dizer “ciclovia” ou “capacete” é reducionismo que desvirtua a compreensão. Entender que ambos podem fazer parte das soluções, mas não são exclusivos, é um caminho para iniciar a conversa.

Soluções ou recomendações absolutas, generalizantes, encaixotadas e de fácil digestão podem ser úteis em campanha eleitoral ou para preencher espaço na televisão, mas estão longe de ter alguma utilidade no planejamento de cidades voltadas para as pessoas.

Em breve na sua tevê, todos os dias no seu pulmão

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Em aproximadamente um mês a sua tevê e o seu jornal começarão a trazer uma porção de matérias alarmantes sobre os riscos de se respirar em São Paulo.

As notícias contarão como é podre o nosso ar, mostrarão os riscos para crianças e idosos, entrevistarão “especialistas” sobre as consequências da poluição, repetirão o “mantra do tempo seco”, trarão recomendações expressas para não fazer exercícios e repetirão à exaustão a “missa da toalha molhada”.

Pouco ou nada se falará sobre as causas da poluição na cidade. Nenhuma ou rara será a nota publicada recomendando deixar a fonte poluidora em casa. O foco das exceções falará sobre a inspeção veicular, botando a culpa em ônibus, caminhões e nos carros velhos.

O deserviço público generalizado será coroado com pinceladas de fantasia: propagandas travestidas de notícias mostrarão  carros a hidrogênio, eletricidade, lixo, água… Protótipos e pesquisas que ainda precisariam de décadas se apresentarão como solução para desviar o foco do problema presente.

Em aproximadamente um mês, a situação limite não permitirá ignorar a qualidade do ar que você respira o ano todo. Mas tudo será feito para continuar escondendo que anti-ecológico por princípio utilizar uma tonelada de máquina para transportar 70kg de gente.

Fogo

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O fim de semana de Virada Cultural começou com o Boteco Urbana, o som do coletivo barulho.org e a presença da ONG ACT** (Aliança de Controle do Tabagismo). Seguiu pelas ruas da cidade até o Jardim da Luz, com fogo, bicicletas e músicas. São Paulo, de graça. Resgate as ruas.

[galeria completa aqui]

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Comece virando no boteco

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Neste final de semana acontece em São Paulo mais uma edição da Virada Cultural. 24 horas de atividades culturais gratuitas em vários pontos da cidade.

No sábado (02), o coletivo Ecologia Urbana realiza mais uma edição do BotEco Urbana. Sob o tema “(re)Virando o Centro”, a atividade etílica de resgate do espaço público acontece a partir das 14h, com a presença do coletivo barulho.org .

Mais informações sobre o 3o BotEco Urbana aqui. E sobre a virada cultural.

Virada Cultural 2007 – lado A
Virada Cultural 2007 – lado B

Cidade acampamento

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A chuva no final da tarde deve ter afastado os menos crédulos, mas pouco depois das 20h, quando nem uma gota caía do céu, cerca de 100 pessoas deixavam a Praça d@s Ciclistas para mais uma bicicletada em São Paulo.

Rolê pelas ruas da capital e mais algumas dezenas de ciclistas se juntam à massa. Panfletagem, conversa e diversão em movimento, trocando o barulho dos motores pelo giro do pedal, a fumaça pelo vento no rosto, o congestionamento de latas pela massa fluida dos veículos a propulsão humana.

De volta à praça, duas, três, quatro barracas começam a ser montadas no gramado: Bicicletada Camping, resgatando a convivência no espaço público.

Noite curta e divertida. Arte, conversa, música e um susto: um pedestre que voltava da balada para para conversar. Resolve se apoiar no guarda-corpo de madeira improvisado há quase um ano pela administração municipal. Em câmera lenta, a estrutura de madeira começa a ceder e o pedestre termina sentado sobre a mureta. Por pouco a noite não termina em tragédia.

A gambiarra de madeira foi improvisada pela Prefeitura depois da reforma nas calçadas da Paulista, no começo de 2008. A solução definitiva, ainda que solicitada algumas vezes durante o ano passado, até hoje não saiu do papel. Na praça, o “protótipo” de metal é figurativo. Os usuários da praça também aguardam há mais de um ano a volta dos paraciclos instalados na véspera do Dia Sem Carro de 2007, retirados para a reforma e jamais instalados novamente.

relatos, fotos e vídeos
álbum de fotos no flickr ou multiply

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