Não é neblina e a culpa não é do inverno


(sábado, 09 de junho, 12h)
A mídia de massa (bancada em boa parte por anúncios de automóveis) andou chamando a poluição da última semana em São Paulo de “neblina”.

Quem respirou em São Paulo nos últimos dias sabe que a névoa paulistana é muito mais suja do que uma simples condensação de partículas de água na altura do solo.

Em inglês, o termo mais adequado para definir o fenômeno é “smog”, uma mistura de “fumaça” (smoke) com “fog” (neblina). Para desinformar os paulistanos sobre o estado de calamidade (e garantir os anúncios de máquinas poluentes chamadas “Eco”), a mídia opta sempre por esconder as causas e falar apenas das conseqüências.

Com a proximidade do inverno, começa a enxurrada de matérias atribuindo o céu cinza ao fenômeno climático chamado de inversão térmica. De fato, “tampa atmosférica” que cobre o céu paulistano durante esta época do ano é real e impede a dispersão dos poluentes. Mas será que a podridão que vemos no horizonte é causada pela inversão térmica ou pelos escapamentos dos quase 6 milhões de automóveis da cidade?

Ao abordar a péssima qualidade do ar, a mídia corporativa nunca utiliza fotos de automóveis com o céu poluído ao fundo. O enfoque das reportagens sobre poluição é sempre o mesmo: como se proteger do ar podre. Nunca vi uma matéria em um jornalão dizendo “deixe o seu carro em casa, use o transporte público, vá a pé ou de bicicleta”.

A tentativa de atribuir as 10 mortes diárias, as crises de asma, o agravamento de crises respiratórias e o céu cinza à fenômenos climáticos cumpre o seu papel: isentar a indústria automobilística e o uso excessivo dos automóveis da culpa.

Na semana que passou, a filha da faxineira que trabalha aqui em casa telefonou à mãe dizendo que as inalações que estava fazendo não estavam surtindo efeito. Com 10 anos de idade, a menina sofre de bronquite e tem o quadro agravado nesta época do ano. Ao final da conversa telefônica, a mãe me contou a história, terminando a frase com o tradicional “também, com esse tempo não tem jeito”…

A família da menina não possui automóvel, mas como tantos outros paulistanos é vítima da mídia de massa, da falta de atitude dos governantes, da indústria automobilística e dos 30% de paulistanos que possuem carro.

4 Comments