O pedestre que se dane

A rua Pamplona, no bairro nobre dos Jardins, foi recapeada há cerca de quatro meses. Como em todas as outras ruas que receberam capa de asfalto no penúltimo estágio do “maior programa de recapeamento de São Paulo”, as faixas de pedestre simplesmente desapareceram.

Segundo o artigo 88 do Código de Trânsito, nenhuma via poderá ser aberta ao tráfego se não estiver devidamente sinalizada. Como a preocupação com o pedestre na capital beira o nada, técnicos e administradores parecem não considerar faixas de segurança como ítens de sinalização.

Em janeiro de 2006, o presidente da CET declarou que a demora para pintar as faixas naquele estágio do recapeamento era culpa da chuva. Será que o culpado dessa vez é a inversão térmica e a falta de chuva? Ou será que o problema são as moções na Índia ou os ventos no deserto do Atacama?

Há algumas semanas a prefeitura iniciou mais uma etapa da renovação do asfalto, ítem obrigatório para todo prefeito que assume o cargo na capital. Dizem as más línguas que o material utilizado pelas empreiteiras brasileiras é um tipo especial chamado “asfalto eleitoral”, com prazo de vida útil de quatro anos.

O custo dos 38km de ruas recapeadas será de R$12 milhões. Segundo a Prefeitura, a média gasta no “maior programa de recapeamento asfáltico da história” é de R$50 milhões por semestre. Até agora, R$186 milhões já foram gastos.


(faixa fantasma e valeta que destrói aros)

Todo prefeito que assume o cargo em São Paulo tem como vitrine o recapeamento de ruas, as operações tapa-buracos e a construção de pontes e viadutos.

Nunca ouvimos falar, no entanto, em um grande programa de pintura de faixas, em uma campanha massiva pelo direito preferencial do pedestre nas travessias ou mesmo em carros multados por ameaçar ciclistas e pedestres, ações que custariam muito menos, serviriam para reduzir o número de mortes e ajudariam na construção de uma cidade mais humana e democrática.

As infrações que dizem respeito à segurança de pedestres e ciclistas sequer fazem parte do rol de atuações dos agentes da CET. Sim, é isso mesmo: os agentes da CET não multam carros que não dão seta ao realizar conversões, não autuam quem ameaça ciclistas ou pedestres e sempre procuram coisas “mais importantes” para fazer do que multar um carro estacionado sobre a calçada.

As desculpas para a falta de autuações que garantam a segurança e o respeito são estapafúrdias. A razão é uma só: a prioridade continua sendo a minoria da população, os 30% que circulam de automóvel pela cidade. E o pedestre que se dane.

[matéria sobre o tema no Incautos do Ontem]

[Abraspe – Associação Brasileira de Pedestres]

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